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Ventriloquismo (Parte 13 - Luz)


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3 respostas a este tópico

#1 LordSnow -Ramsay

LordSnow -Ramsay

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Publicado 18 janeiro 2018 - 20:27

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''As vezes eu me sinto como se eu não sentisse nada, como se eu fosse só uma minúscula pena flutuando no céu estrelado, quase invisível de se ver em meio a tanta escuridão e estrelas corrompidas que parecem brilhar mais do que deviam. É tudo tão confuso e tudo é tão estranho.

As vezes eu passo a noite toda acordada quando percebo que definitivamente eu não vou conseguir dormir e, se consigo, não tenho forças para me levantar da cama porque acho que nada mais vai dar certo para mim, eu não vou ter um ''raio de sol'' na minha vida como o meu pai insiste em me lembrar que eu sou o dele.

Eu venho perdendo muito peso recentemente porque não consigo comer nada, eu simplesmente encaro a comida na minha frente e fico pensando se realmente vale a pena eu gastar alguma força ou energia naquilo, se eu realmente quero aquilo. As coisas tem andado estranhas comigo desde que meu pai e minha mãe me obrigaram a fazer aquela droga de festa de aniversário.

Eu já me sentia sozinha antes dela, e eu pensava que eu já estava no fundo do poço, ou seja, não teria como eu descer mais ainda porque o piso terroso e cheio de sujeira e ratos imundos me sustentava. O que me deixa mais triste não é eu ter ultrapassado esse piso imundo, mas sim que eu estava errada. O fato de eu estar errada me veio em mente se eu já estivesse certa em alguma situação da minha vida, se eu já fiz realmente algo edificador ou considerado pelo menos ''não lastimável''. 

Eu penso em quantas pessoas estão todo o dia sentadas em posição fetal chorando neste piso cheio de ratos enquanto as pessoas que estão lá em cima não são capazes de jogar uma corda pra elas subirem, e, nem ao menos perguntam para ela como ela está. Eu sei, é claro que ela está numa maldita situação, mas esse tipo de pergunta me faz bem, sabe. Me dá a esperança de que pelo menos alguém se importa como eu estou.

Sabe o curioso da menção ao poço? É que você só pode olhar para cima, ou seja, você olha pro céu. Pro azul multicolor do céu. A questão é que as pessoas que estão na minha situação não querem olhar pro céu, elas querem olhar pra baixo, onde não tem nada além de poeira e sujeira. As vezes esperamos que alguém lá de cima nos jogue a corda para podermos tomar novos rumos em nossos olhos, mas não é qualquer pessoa que pode jogar essa corda, tem de ser alguém que se preocupa de verdade com a pessoa do poço, porque caso for apenas um charlatão, a corda só servirá para virar uma forca. Bem, eu espero que alguém me jogue essa corda o mais rápido possível porque eu não sei quanto tempo mais eu vou conseguir aguentar.

Em poucos meses eu sofri e senti coisas que eu nunca pensei que sofreria e sentiria: ver as próprias lágrimas escurecerem minhas roupas, ver quem se preocupa comigo aflito e ver sangue. Ver sangue mais que o normal em lugares em que ele não deveria colorir a pele de vermelho vivo.

A inquietude abala minha concepção quando eu simplesmente fico deitada - ou jogada - na cama e olhando pro teto, esperando por alguma corda ou grito que me faça levantar. Eu sinto um vazio preenchido de amargura e remorso dentro de mim a ponto de eu achar que estou ficando tão doente que daqui a alguns dias terei de conviver com a triste realidade de que magoei meus pais pela última vez.

Sabe, eu gostava de escrever e de desenhar. Eu realmente gostava, mas isso tudo simplesmente sumiu da minha vida numa questão de falta de percepção. 

Eu gostava de desenhar borboletas amarelas, escrever poesias sobre o amor e ficar olhando pro céu enquanto tentava criar novas imagens pras nuvens que iam se desvinculando umas das outras, mas parei de gostar. Parei de querer gostar daquilo.

Se eu escrevo ou desenho algo hoje é justamente algo que eu tenho medo, algo que faz minha pele congelar e tremer, mas não algo que eu não esteja acostumada. Isso é o pior de tudo.

Eu queria ser a pessoa da corda pra alguém que está calado no poço, mas eu não sei como. Eu não sei nem como me ajudar

Se alguém estiver lendo isso, rezo para que tenha uma corda.''

 

 

É muito difícil explicar o que seria considerado um milagre para alguém pensava Alicia. Foi tão complicado explicar para os médicos que Alicia de uma hora para a outra foi curada que ela foi submetida a vários exames e testes médicos para que os profissionais considerassem e argumentassem o óbvio: Alicia estava curada de tudo.

A questão é que eles não sabiam explicar e muito menos como reagir àquilo (o que tão-pouco Desmond e Alyssa eram capazes de fazer, senão aos soluços e lágrimas nos olhos), então simplesmente liberaram Alicia enquanto viam a família sair do hospital.

No caminho para a casa, o carro do pai de Alicia parecia mais um show de stand-up, só se podia escutar risos baixinhos e sorrisos repentinos enquanto olhavam para o retrovisor e avistavam Alicia com a mesma expressão de antes de ser curada. Era tudo muito confuso para ela. Ainda era.

Alyssa levou sua mão ao encontro da mão de Alicia e sorriu para a filha amada. Os olhos da filha eram os mesmos da mãe.

-Você quer passar em algum lugar, querida? - Sua voz era chorosa, mas não de um choro triste.

-Não, obrigada mãe. - Alicia forçou um sorriso e as duas ficaram se encarando com expressões diferentes.

 

Quando chegaram em casa, Desmond e Alyssa deram um abraço apertado em Alicia e só a deixaram sair dele quando perceberam que ela estava perdendo o ar por ser sufocada entre os braços deles. 

A primeira coisa que Alicia fez quando chegou em casa foi subir para seu quarto e se trancar lá enquanto pensava em que momento da sua vida tudo tinha ficado tão estranho e violento. Em que momento ela imaginaria que ia levar um tiro de um psicopata conhecido de Harry?

Ela lembrou de momentos em que já esteve assim, completamente perdida e imersa em pensamentos, olhando para o teto enquanto se deixava largada na cama. Não eram boas recordações e muito menos bons momentos em sua vida.

Ela pensava como Nia sabia que ela estava no hospital, pensava na proposta de Harry, pensava em como seria sua vida daqui para frente. Eram várias coisas para analisar, mas ela tinha tempo.

O som do canto dos pássaros ajudava ela a pensar e a raciocinar algo inteligente, mas não a ajudava a fazer o impossível. Não a ajudava a encontrar uma saída que beneficiasse todos naquele tipo de situação.

Alicia deveria estar morta se não tivesse chegado naquele hospital. O tiro claramente poderia ter sido com a intenção de mata-la. E se fosse? Se fosse, Tom voltaria. Voltaria e não machucaria só Alicia, machucaria todos que estivessem do lado dela. Isso não saía de sua cabeça, era como se tomasse todo o seu cérebro e o obrigasse a torturar todo o seu corpo. Ela deveria ligar para a polícia ou não? Deveria visitar Harry ou não? Deveria ir na floresta e ter com Nia ou não? Tudo era novamente confuso.

Ela olhou para a janela do quarto e viu uma borboleta de asas amareladas como ouro puro parada em sua direção. 

-Você não tem tantas preocupações assim, tem? - Alicia perguntou para ela mas sabia que isto seria um monólogo. 

Ela se levantou e abriu a janela, fazendo com que a borboleta entrasse em seu quarto e pousasse em seu ombro direito, ainda batendo as asas douradas.

Alicia olhou para seu ombro e sorriu. Lembrava de como gostava de desenha-las na sua infância e no começo de sua adolescência, de como gostava de admirar e de ver o mundo de uma maneira única e inocente. 

Se aquilo significava algo, ela não sabia.

De repente a borboleta voou de seu ombro e flutuou como se estivesse se teletransportando em direções curtas. Ela ficou parada sobre a peça de abrir uma das gavetas de sua cômoda como se estivesse incitando Alicia a abri-la.

Alicia se sentou em sua cama e ficou observando a borboleta estática naquele lugar. Chegava até a ser uma fotografia bonita se ela estivesse com alguma máquina fotográfica.

Tantas coisas se passaram em sua mente naquele curto tempo que, para despistar aquela onda de pensamentos, tentou se recordar no que guardava naquelas gavetas velhas.

Foi aí que ela se levantou e provocou o voo da borboleta em direção à janela para checar o que tinha lá.

 

 

''Faz tempo que eu não escrevo em você, velho amigo. Passamos por tanta coisa que eu não sei como te deixei jogado numa gaveta velha assim. Quer dizer, eu passei. 

Sabe, eu não me imaginava assim quando eu escrevi pela última vez aqui. Me imaginava uma garota triste e sem ninguém, uma garota que ficava dentro de casa o dia todo sem fazer nada a não ser imaginar como as coisas seriam se tudo fosse diferente. 

Eu hoje sou menos sozinha do que era antes, mas não quer dizer que as coisas se tornaram menos complicadas e menos difíceis, pelo contrário, eu aprendi que um tiro no ombro torna tudo mais difícil, sem exceção.

Eu acho que hoje tenho pessoas que posso pelo menos confiar algum segredo ou alguma parte da minha história obscura: Nia, Harry, meus pais... até a avó da Nia, quem sabe. 

Ao longo do tempo eu percebi que não existem pessoas idiotas como eu achava que existia, existem pessoas sozinhas e com problemas, como todo mundo. 

Se aos 14 anos eu visse Harry, o meu n... ex-namorado, eu juraria que ele era um idiota que não merecia ter um lugar nesse mundo, mas eu aprendi que as pessoas não são as atitudes dela ou as palavras, são os sentimentos. Cada um reage de forma diferente a alguma coisa, senão com algum gesto benevolente. Esse tipo de gesto faz com que todos reajam de maneira superficial, faz com que todo mundo se sinta estimado ou pelo menos amado. Infelizmente eu aprendi isso da pior forma possível, com Harry espancado e seu rosto praticamente desfigurado. 

Sabe, o meu gesto de ter me mutilado em incontáveis situações não definiam meu gosto pelo meu corpo, as minhas palavras de ódio contra eu mesma não definiam meu amor próprio. Tudo sempre dependeu do que se passava dentro de mim.

Eu talvez escreva nesse caderno de capa preta um pouco da minha vida daqui pra frente, talvez eu acorde em outro lugar até eu perceber que levei um tiro na cabeça daquele maníaco. Eu não sei o que vai acontecer nos próximos minutos, nas próximas horas, nos próximos dias.

A questão é que a nossa vida é como um poço bem fundo: você não sabe o que tem lá em baixo, só pode ouvir o que vem pela frente, e se não gostar, você pode passar por aquele poço sem remorso algum. O remorso chega quando você se dá conta de que aquele poço não é só seu, o poço é de todos que vivem ao seu lado. É quando você percebe que preferiu se apegar à sua felicidade do que jogar uma corda naquele poço escuro e resgatar quem pulou nele porque não achava que tinha mais alguma opção a não ser pular na escuridão para não ser mais ouvido ou visto.

É por isso que eu escrevo aqui, para que vocês sejam as pessoas que jogam a corda para puxar as pessoas, e não porque sentirão remorso se passarem pelo poço.''

 

Alicia olhou para o caderno mais uma vez e o fechou, guardando-o em sua mochila e, antes de fazer mais alguma coisa, olhou para a janela e encontrou algo que a fez sorrir.

 


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#2 SrN1nj4

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Publicado 18 janeiro 2018 - 21:47

Ramsay... Parabéns... Mais um capítulo INCRÍVEL como sempre, o melhor até agora por retratar um pouco mais do passado de Alicia e do que ela havia escrito.(Emocionante e Verídico).

 

Em relação á metáfora do poço é realmente a verdade de muitos,tendo aqueles que estão no fundo do poço, como a aqueles que passam sem remorso e não jogam a corda para a pessoa que precisa de ajuda.

 

Continua que está cada vez... (Não da pra explicar isso).

 

Só me responda uma coisa. 

Porque o senhor me fez esperar tanto tempo pelo décimo terceiro capítulo? Não faz mais isso comigo viu :D .


  • user966 e LordSnow -Ramsay curtem isto

"Num tempo de engano universal, dizer a verdade é um ato revolucionário." - George Orwell.

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#3 LordSnow -Ramsay

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Publicado 19 janeiro 2018 - 11:17

Ramsay... Parabéns... Mais um capítulo INCRÍVEL como sempre, o melhor até agora por retratar um pouco mais do passado de Alicia e do que ela havia escrito.(Emocionante e Verídico).

 

Em relação á metáfora do poço é realmente a verdade de muitos,tendo aqueles que estão no fundo do poço, como a aqueles que passam sem remorso e não jogam a corda para a pessoa que precisa de ajuda.

 

Continua que está cada vez... (Não da pra explicar isso).

 

Só me responda uma coisa. 

Porque o senhor me fez esperar tanto tempo pelo décimo terceiro capítulo? Não faz mais isso comigo viu :D .

 

Obrigado por todo o apoio  (inlove) . Nesse capítulo eu quis trazer um clima um pouquinho mais pesado e mais melancólico levando a história pra primeira pessoa através do caderno (até porque fica mais fácil da história ficar sadness assim haha). Tanto que foi a primeira vez que eu escrevi com uma música instrumental, nunca tinha tentado antes hehe

 

Bem, eu tinha parado de escrever um pouquinho e eu meio que desanimei com a história, mas digamos que alguém me convenceu a voltar e eu recuperei o ânimo em escreve-la hehe

 

 

Abraços,

Ramsay :D


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#4 SrN1nj4

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Publicado 19 janeiro 2018 - 11:44

Obrigado por todo o apoio  (inlove) . Nesse capítulo eu quis trazer um clima um pouquinho mais pesado e mais melancólico levando a história pra primeira pessoa através do caderno (até porque fica mais fácil da história ficar sadness assim haha). Tanto que foi a primeira vez que eu escrevi com uma música instrumental, nunca tinha tentado antes hehe

 

Bem, eu tinha parado de escrever um pouquinho e eu meio que desanimei com a história, mas digamos que alguém me convenceu a voltar e eu recuperei o ânimo em escreve-la hehe

 

 

Abraços,

Ramsay :D

Que bom que essa pessoa lhe deu ânimo, pois eu tava parado aqui no fórum. E gosto de ler mais sua história do que qualquer outra coisa. Estava tentando lhe mandar mensagem para ver o que havia acontecido mas você bloqueou o chat  (angry) :D .


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