Afinal, quem ou o que é Yoyodyne?
Questão complexa. Sabe-se que é uma grande organização, considerada criminosa para alguns, que está notadamente por trás de diversos atos que atentam contra a ordem mundial. Não se enquadram como terroristas ou adversários. Apenas provocam baderna vez ou outra. Coincidentemente ou não, o sistema de heróis existe para combater esta problemática cotidiana.
Os heróis são fichados e organizados de forma transparente, visando um controle por parte do Estado. Combatem o mal, lutam entre si, organizam-se em times, famílias, ordens e grupos, colecionam troféus e honra, constroem suas bases e fazem a sua história. Ah, e ajudam senhoras a atravessarem a rua sempre que podem, claro.
Era um dia como qualquer outro para o Pedra do Rei, um time em crescimento naquele mundo tumultuado. Seus heróis ainda eram crianças se comparados com os IgUaNaS, Brazil Power ou mesmo o CARNIFICINA, os times mais desenvolvidos daquele lado do mundo. Contudo, tinham o seu charme, com a base localizada em uma pequena sala no Centro de Granbury.
O telefone passou a tocar irritantemente. Elina, uma das conselheiras do time, pensou um pouco antes de atender: normalmente era a proprietária cobrando o aluguel que vez ou outra atrasavam, nada muito sério. Mas estavam rigorosamente em dia. VILÃO! Correu para atender o telefone.
- Sim, comissário?
Silêncio. O telefone permaneceu mudo por uns bons instantes, quando passou a ecoar uma leve estática ao fundo.
- Pedra do Reino? - Uma voz que soava como uma pessoa fortemente gripada, rouca e profunda. A estática aumentava suavemente a cada palavra. – Com quem falo...?
- Er... Elina. – Não conhecia aquela voz, denunciando um pouco de sua preocupação. – Sim, é do Pedra do Reino. Procura alguma coisa em especial, senhor?
- Sim, sim, sim! – Uma risada cortada por algumas tossidas e um ar cada vez mais sinistro no tom daquele homem. A estática agora ecoava mais irritantemente, embora não atrapalhasse a conversa. – Estou transmitindo um recado de Gabrielle para você, disposta a ouvir?
Gabrielle. Quem diabos era Gabrielle? Mas era uma heroína – meio avessa, mas vá lá heroína – e tinha de ouvir aquele recado. Podia ser algo realmente importante.
- Pode falar. Já estamos aqui, afinal.
- Ela disse que era para te contar que está presa em um castelo acessível por meio do Capitólio, sob um graaaaaande – tossia com mais força enquanto tentava afinar a voz para imitar o possível tom da menininha, limpando a garganta e pigarreando – prédio com uma placa de alguma base heróica com um F em um fundo vermelho e branco redondo. Acho que era isso. Bem, minha parte foi dita...
- Espere um pouco! O que isso quer dizer?
- HIHIHIHIHIHIHIHIHIH! BADA BWI BA BA BADA BO!
E desligou. E deixou Elina sem cara enquanto tentava digerir toda àquela informação. Paralisada, com cara de tacho, enquanto suas longas madeixas loiras tremulavam com o vento que adentrava a janela. Ventos frios, ventos sombrios.
- Ei Elina, o que tá pegando aê?
A voz levemente fanha era de fácil reconhecimento para a consultora: era DrakeDuCaine, um forte (e preguiçoso) herói do Pedra. Embora tivesse um nível bem alto para o time, servindo como exemplo para os outros, era gordinho e desleixado, deixando a barba por fazer na face enquanto desfilava com seu macacão de neoprene rosa raro que ficava ainda mais ridículo do que na teoria. Um perfeito contraste com a organizada Elina, que se irritava com o balançar dos cabelos na medida em que pensava na resposta certa.
- Acho que temos algo a fazer. Drake, quem mais está na base?
- Hã... Hm... Além de nós dois? Tem o Fredo também, mas...
- Pegue ele pelo laço. Vamos ao Capitólio.
- Mas o Fredo está...
- Não interessa!
DrakeDuCaine coçou sua cabeleira rala e despenteada, pensando em como dizer não para Elina. Não conseguiu arrumar uma desculpa ou tarefa aceitável para dissuadir aquela loira, especialmente com tal poder impositivo. Suspirando, virando as costas e deixando seu lençol azul noturno balançar com o vento que entrava. Tinha de buscar Fredo. Fredo, Fredo, Fredo. Enquanto isso, Elina descia pelas escadas, gritando com Drake alguma coisa que não conseguia entender. Só quando se aproximou que...
- ... lá no Yoyobucks, entendido?
- Não entendi coisa alguma, você saiu berrando escada abaixo!
- Céus, preste atenção! – Elina parecia realmente aborrecida, odiando ter de se repetir para aquele folgado que nunca prestava atenção ou acompanhava seu raciocínio. – Resumirei para não me aborrecer: encontre Fredo e leve-o ao Yoyobucks, estarei esperando vocês lá. Entendeu?
- Aye~aye, capitã.
Ainda aborrecida, Elina desceu. Após esperar alguns instantes, DrakeDuCaine desceu, chegando a uma daquelas ruas relativamente suaves do centro de Granbury. Rua acima, já tinha certeza de onde ele estaria. Minutos depois, avistando o prédio da Yoyodyne, gritou para o magrelo desajeitado que observava os arredores.
- Você acha mesmo que algum bandido vai mesmo sair pela porta da frente, Fredo? Pel’amor!
Fredo era uma pessoa... excêntrica. Não era muito forte, estava na média do time, mas era alto e desajeitado. Usava um macacão dos anos 70, com uma pistola d’água em mãos, observando atentamente todos que passavam. Cabelos médio-longos, pouca coisa abaixo do ombro, preso atrás, meio dentuço e tinha a barba bem feitinha, rostinho lisinho. Apesar disso, era um dos primeiros heróis e, por alguma misteriosa e incompreendida razão, simplesmente parou no tempo e estava ali, com o Pedra do Rei. Jurava de pés juntos que havia participado da criação do CARNIFICINA.
- Não sei! Vá saber? O mundo é perigoso, nunca se sabe quando a Yoyodyne irá agir!
- Ah, tá bom, tá bom. ‘Bora, a Elina tá nos chamando. Trabalhar.
Usar a palavra trabalho causava um forte pesar em Fredo. Não queria ter de passar a tarde no Malwart de novo.
- O aluguel tá em dia, não?
- Não, não é isso! Trabalho, missão! – DrakeDuCaine não associava trabalho ao trabalho diário mesmo simplesmente por não trabalhar. Era acomodado, encarava a miséria, mas não se submetia ao trabalho mundano.
- Ah... Yoyodyne? – Os olhos de Fredo brilhavam com um fervor que todos conheciam bem: era notória a obsessão dele com o Grande Conglomerado do Mal que, contudo, convivia no dia a dia. Lembrava um pouco um certo vilão eternamente careca de outro universo, mineiro de kryp... enfim.
- É, é. Deve ser. – Apenas virou as costas e passou a caminhar. Fredo o acompanhou ansioso, desviando das linhas dos blocos da calçada. Cansado de indisposição, DrakeDuCaine simplesmente seguiu caminhada acima.
As madeixas loiras da heroína eram visíveis aos dois, mesmo antes de realmente se aproximarem do Yoyobucks. Seu uniforme chique de escoteiro era quase engraçado com suas madeixas, sendo salva pelo fato de não ser tão alta. Aquela bermudinha não parecia tão ridícula. Sua capa gloriosa azul-marinha lhe dava um ar imponente... que não assentava com o conjunto. Era uma heroína querendo subir, afinal: usava o que era útil, não o que era bonito.
- Pensei que eu teria de buscá-los eu mesma.
- Aye, apressada. Comemos um cachorro-quente... ou você acredita que apenas você pode ir trabalhar de estômago cheio? – Respondia DrakeDuCaine enquanto Fredo apenas olhava. Era uma das poucas pessoas que ele tinha medo: daquela consultora. Não era forte, mas sabia se impôr.
Com um suspiro, Elina jogou seu copo vazio na lixeira e passou a caminhar. Os dois, trocando olhares que pareciam dizer “doida”, apenas a acompanharam. Tinham uma viagem até o Capitólio para cobrir... e rápido.